Comentários das Liturgias
SOLENIDADE DA EPIFANIA DO SENHOR
SOLENIDADE DA EPIFANIA DO SENHOR
Is 60,1-6 / Sl 71 / Ef 3,2-3a.5-6 / Mt 2,1-12
O auge da espiritualidade natalina é a solenidade da Epifania do Senhor, ou seja, a Sua manifestação como Salvador de toda a humanidade. Enquanto São Lucas enfatiza a adoração dos pastores ao Menino Jesus, revelando a acolhida da salvação entre os pobres e pequenos, São Mateus destaca a visita dos magos do oriente, os quais levam presentes e adoram o Menino, indicando que toda a humanidade, em adoração, acolhe Jesus como Senhor e toma posse da salvação que Ele veio trazer. É a confirmação de que Deus vem para salvar toda a humanidade e não somente um povo ou um grupo selecionado.
Esse plano salvífico estendido a todos os povos e nações já fora anunciado pelo profeta Isaías, ao descrever a manifestação da glória de Deus, como luz que dissipa todas as trevas. Em Jerusalém, símbolo da fidelidade e da consagração a Deus, Isaías anuncia que serão reunidas todas as nações da terra, as quais trarão suas oferendas e proclamarão a glória de Deus. A mentalidade nacionalista que tomou conta do povo de Deus, depois do exílio na Babilônia, gerou uma leitura exclusivista das palavras de Isaías, compreendendo Jerusalém como uma referência explícita ao povo de Israel, enquanto proprietário da salvação de Deus. A partir disso, proclamava-se que os descendentes de Abraão tinham a posse exclusiva da salvação.
São Paulo, escrevendo aos Efésios, rompe com esse exclusivismo da graça, ensinando que a salvação concedida por Jesus é estendida também aos pagãos. Estes recebem a mesma herança do povo de Israel, são associados à mesma promessa e se tornam membros do mesmo Corpo Místico de Cristo. É neste espírito de comunhão universal que São Mateus apresenta a visita dos magos, símbolo de todos os povos conhecidos da época, que não apenas reconhecem que Jesus é o Salvador, mas acolhem essa graça divina concedida a toda a humanidade.
Essa mentalidade exclusivista, de fechamento, perdurou também em nossa Igreja Católica. Até o Concílio Vaticano II imperava a convicção de que “extra ecclesia, nula salus”, ou seja, fora da Igreja não há salvação, pois somente seria salvo quem tivesse recebido o batismo na Igreja Católica. O Concílio ensinou que na Igreja Católica há a plenitude dos meios para receber a salvação, mas isso não exclui os que estão fora, pois a salvação é dom oferecido por Deus a quem O acolhe com fé, e não propriedade de um povo ou de uma Igreja.
A cultura da globalização que hoje impera em nossa sociedade une povos e culturas por meio da tecnologia, mas não consegue criar verdadeiros laços de comunhão entre as pessoas. Continua perdurando a tendência ao exclusivismo de grupos, seja por questões econômicas, culturais e até mesmo religiosas. Infelizmente, encontramos essa mentalidade exclusivista em algumas Igrejas e grupos religiosos, os quais pregam que somente seus membros são filhos de Deus e somente eles recebem a bênção divina. A marginalização gerada pelo exclusivismo é uma forma de violência, uma violência simbólica, que muitas vezes acaba provocando a violência física.
Diante dessas posturas excludentes, somos convidados a contemplar a cena dos magos do oriente prostrados diante do Menino Jesus, compreendendo que Deus quer salvar a todos, sem privilégios e sem exclusões. A estrela que deve nos guiar hoje é a Palavra de Deus revelada plenamente em Jesus Cristo, como salvador de toda a humanidade. Ao encontro do Senhor caminhamos levando nas mãos o nosso empenho em construir relacionamentos cada vez mais fraternos e de verdadeira comunhão.